Preparação prévia como professor para iniciar o processo educacional com aluno que tem surdez profunda, conhecendo apenas libras para comunicação, não sendo oralizado nem conhecendo português.

“Na segunda semana do próximo ano, professores e funcionários da escola “O espaço da Educação” participarão durante dois dias de atividades pedagógicas dedicados ao planejamento interno da escola, quando serão definidas normas, propósitos curriculares e formas de avaliação, além de três dias de formação. A escola irá receber alunos da inclusão, dentre eles João, com 10 anos de idade, com surdez profunda, que irá cursar o 6ºano. No momento do planejamento serão debatidos os seguintes assuntos:” (observação-dados fictícios)

*Conhecer a surdez: anatomia e funcionamento do sistema auditivo;
*Conhecer a Língua Brasileira de Sinais;
*Ter em mãos dicionário ilustrado de libras;
*Sensibilizar o professor para a experiência com a surdez;
*Estar em sintonia com o intérprete e o professor de recursos e o professor surdo no que tange a aplicação dos conteúdos e de aulas bem como a elaboração de provas e correção das mesmas.


Diagnóstico das condições do aluno: Conhecer as características da surdez (surdez profunda- acima de 91 dB. Nesse caso a pessoa poderá ter dificuldade para ouvir o ruído de caminhão, de discoteca, de uma máquina de serrar madeira ou ainda, o ruído de um avião decolando). Dificilmente desenvolverá a linguagem oral espontaneamente; só responde auditivamente a sons muito intensos como: bombas e trovão; frequentemente utiliza a leitura orofacial; necessita fazer uso de aparelho de amplificação/ ou implante coclear, bem como de acompanhamento especializado. Saber do período de aquisição; causas da surdez; localização. Analisar o desenvolvimento em relação ao aprendizado e domínio da L. Portuguesa.Observar a sociabilidade, cognição, linguagem ( oral, escrita, viso espacial), afetividade, motricidade, aptidões, interesses, habilidades e talentos.Registrar as observações iniciais em relatórios, contendo todos os dados colhidos ao longo do processo e demais avaliações relativos ao desenvolvimento do desempenho de cada um.


Adaptações do aluno em sala:
*Acompanhamento de um intérprete;
*Riqueza de materiais e recursos visuais ( imagéticos) para possibilitar a abstração dos significados.
*Conscientização dos colegas em relação ao respeito de suas individualidades.


Instalação de artefatos tecnológicos necessários:
*Sala com imagens visuais de todo tipo de referências que possam colaborar no aprendizado;
*Alfabeto manual; Mímica e dramatização; Vídeo/ TV/ retroprojetor, computador, slides;Softwares educativos;
*Língua Portuguesa oral/ leitura labial; Língua Portuguesa escrita ( palavras chave);
Solução para entraves ao desenvolvimento didático devido a deficiência:
*Atendimento em período contrário ao da escolarização para desenvolver a modalidade oral da língua portuguesa: Práticas metodológicas do ensino de segundas línguas;
*Utilização da escrita na interação simultânea professor/ aluno ( conversação);
*Escolha prévia de textos de acordo com a competência lingüística dos educandos;
*Apresentação de referências relevantes (contexto histórico, enredo, personagens, localização geográfica, biografia do autor, etc) sobre o texto, em língua de sinais ou utilizando outros recursos, antes de sua leitura;
*Exploração do vocabulário e da estrutura do texto (decodificação de vocábulos desconhecidos, por meio de emprego de associações e analogias);
*Apresentação do texto por escrito;Ênfase nos aspectos semânticos e estruturais do texto;
*Estímulo à formação de opinião e do pensamento crítico;Interpretação de textos por meio de material plástico ( desenho, pintura e murais) ou cênico ( dramatização e mínica);
*Adequação de conteúdos e objetivos; Avaliação diferenciada, considerando-se a interferência de aspectos estruturais da língua de sinais.
*Ações de acolhimento coletivas que incluam os demais alunos e outros atores da escola; *Informar a comunidade escolar sobre a diferença relativa à surdez, suas especificidades e a língua de sinais;
*Refletir sobre a necessidade de utilizar a língua de sinais no processo educacional e buscar formas para sua aquisição e desenvolvimento pelos demais alunos e profissionais da escola, a partir de suas relações com associações de surdos ou outras referências comunitárias;
*Desenvolvimento de atividades visando integração com os outros alunos:Trabalhos em grupos;Apresentações.Execução de exercícios e provasPlanejar atividades amplas, que tenham diferentes graus de dificuldade e que permitam diferentes possibilidades de execução e expressão;
*Propor várias atividades para trabalhar um mesmo conteúdo;
*Criação de um glossário ilustrado com termos específicos( para ampliação do vocabulário de Português).
*Utilizar metodologias que incluam atividades de diferentes tipos, como pesquisas, projetos, oficinas, visitas, etc;
*Organizar o tempo das atividades propostas, levando-se em conta que atividades exclusivamente verbais tomarão mais tempo de alunos surdos;
*Alterar objetivos que exijam percepção auditiva;
*Utilizar diferentes procedimentos de avaliação que se adaptem aos diferentes estilos e possibilidades de expressão dos alunos.
*Algumas áreas necessitarão de adaptações curriculares.
*Trabalho cooperativos com outros alunos.
*Organizar as atividades de aprendizagem em pequenos grupos para estimular a cooperação e comunicação entre os alunos.
*Avaliação do alunos: resultados de provas periódicas classificatórias não devem ser supervalorizadas, o que deve prevalecer são as observações diárias de caráter diagnóstico. Em relação a avaliação formal certos cuidados na elaboração e aplicação devem ser tomados.
*Conteúdos devem estar adequados ao que foi trabalhado durante as aulas de português escrito, as questões devem estar relacionadas umas as outras , delineando um contexto lógico em toda a prova.

Interação com a família do aluno
*Contato com a família através de agendas e reuniões.
*sensibilização dos familiares e a população em geral para o respeito às potencialidades dos surdos, objetivando a integração plena dos seus alunos.

"A integração do aluno surdo é um desafio que deve ser enfrentado com coragem, determinação e segurança. A decisão de encaminhar um aluno para a classe de ensino regular deve ser fruto de um criterioso processo de avaliação. Finalmente, deve-se ter clareza que essa integração não passa exclusivamente pela sua colocação na turma com crianças ouvintes. A verdadeira integração implica em reciprocidade. A criança surda poderá iniciar seu processo de integração na família, na vizinhança, na comunidade, participando de atividades sócio-recreativas, culturais ou religiosas com crianças e adultos "ouvintes" e dar continuidade a esse processo na escola especial ou regular, de acordo com suas necessidades especiais. Garantir ao aluno surdo um processo de escolarização de qualidade é fator fundamental para sua integração plena."


Bibliografia: DAMÁZIO, Mirlene Ferreira Macedo. Atendimento Educacional Especializado- Pessoa com Surdez. Brasília/DF :SEESP/SEED/MEC. 2007ARANHA, Maria Salete Fábio. Saberes e práticas da Inclusão. Desenvolvendo competências para o atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos surdos. Brasília/ DF :SEESP/MEC. 2005
webliografia: http://www.ines.gov.br/ines_livros/32/32_006.HTM

Contribuição: Marilanda e Marília


Educação Escolar Inclusiva para Pessoas com Surdez e as Práticas Pedagógicas


Educação Escolar Inclusiva para Pessoas com Surdez

A inclusão do aluno com surdez deve acontecer desde a educação infantil até a educação superior, garantindo-lhe, desde cedo, utilizar os recursos de que necessita para superar as barreiras no processo educacional e usufruir seus direitos escolares, exercendo sua cidadania, de acordo com os princípios constitucionais do nosso país. Se somente o uso de uma língua bastasse para aprender, as pessoas ouvintes não teriam problemas de aproveitamento escolar, já que entram na escola com uma língua oral desenvolvida. A aquisição da Língua de Sinais, de fato, não é garantia de uma aprendizagem significativa.
O ambiente em que a pessoa com surdez está inserida, principalmente o da escola, na medida em que não lhe oferece condições para que se estabeleçam trocas simbólicas com o meio físico e social, não exercita ou provoca a capacidade representativa dessas pessoas, conseqüentemente, compromete o desenvolvimento do pensamento.
Considerando a necessidade do desenvolvimento da capacidade representativa e lingüística dos alunos com surdez, a escola comum deve viabilizar sua escolarização em um turno e o Atendimento Educacional Especializado em outro, contemplando o ensino de Libras, o ensino em Libras e o ensino da Língua Portuguesa.
As práticas pedagógicas constituem o maior problema na escolarização das pessoas com surdez. Torna-se urgente, repensar essas práticas para que os alunos com surdez, não acreditem que suas dificuldades para o domínio da leitura e da escrita são advindas dos limites que a surdez lhes impõe, mas principalmente pelas metodologias adotadas para ensiná-los.

Momento Didático-Pedagógico:
O Atendimento Educacional Especializado em Libras na Escola Comum
O atendimento ocorre diariamente, em horário contrário ao das aulas, na sala de aula comum.
A organização didática desse espaço de ensino implica o uso de muitas imagens visuais e de
todo tipo de referências que possam colaborar para o aprendizado dos conteúdos curriculares em estudo, na sala de aula comum. Os materiais e os recursos para esse fim precisam estar presentes na sala de Atendimento Educacional Especializado, quais sejam: mural de avisos e notícias, biblioteca da sala, painéis de gravuras e fotos sobre temas de aula, roteiro de planejamento, fichas de atividades e outros.
Na escola comum, é ideal que haja professores que realizem esse atendimento, sendo que os mesmos precisam ser formados para ser professor e ter pleno domínio da Língua de Sinais. O Professor em Língua de Sinais, ministra aula utilizando a Língua de Sinais nas diferentes modalidades, etapas e níveis de ensino como meio de comunicação e interlocução.


Momento Didático-Pedagógico:
O Atendimento Educacional Especializado para o ensino de Libras
Este atendimento constitui outro momento didático-pedagógico para os alunos com surdez incluídos na escola comum. O atendimento inicia com o diagnóstico do aluno e ocorre diariamente, em horário contrário ao das aulas, na sala de aula comum. Este trabalhado é realizado pelo professor e/ou instrutor de Libras (preferencialmente surdo), de acordo com o estágio de desenvolvimento da Língua de Sinais em que o aluno se encontra. O atendimento deve ser planejado a partir do diagnóstico do conhecimento que o aluno tem a respeito da Língua de Sinais.


Momento Didático-Pedagógico:
O Atendimento Educacional Especializado para o Ensino de Língua Portuguesa
Acontece na sala de recursos multifuncionais e em horário diferente ao da sala comum. O ensino é desenvolvido por um professor, preferencialmente, formado em Língua Portuguesa e que conheça os pressupostos lingüísticos teóricos que norteiam o trabalho, e que, sobretudo
acredite nesta proposta estando disposto a realizar as mudanças para o ensino do português aos alunos com surdez.

Nesta perspectiva, a sala de recursos para o Atendimento Educacional Especializado em Língua Portuguesa deverá ser organizada didaticamente, respeitando os seguintes princípios:

• Riqueza de materiais e recursos visuais (imagéticos) para possibilitar a abstração dos significados de elementos mórficos da Língua Portuguesa.
• Amplo acervo textual em Língua Portuguesa, capaz de oferecer ao aluno a pluralidade dos discursos, para que os mesmos possam ter oportunidade de interação com os mais variados tipos de situação de enunciação. Dinamismo e criatividade na elaboração de exercícios, os quais devem ser trabalhados em contextos de usos diferentes.

Fonte: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/aee_da.pdf
Contribuição e Postagem: Marília

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Falar com as mãos

Levar os surdos para a sala regular exige nova postura do professor, tato para lidar com o intérprete e, acredite, muitas explicações orais

A inclusão de crianças com deficiência auditiva sempre foi polêmica, mas recentemente ganhou um novo rumo em nosso país. De acordo com a política do governo federal, elas não devem mais ficar segregados nas escolas especiais e precisam estudar desde cedo em unidades comuns, com um intérprete que traduza todas as aulas para a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e o contraturno preenchido por atividades específicas para surdos. Problema resolvido? Nem de longe. Enquanto entidades do setor ainda denunciam a falta de estrutura para a implementação das regras (leia o quadro na página 74), os docentes já começam a receber parte dessa nova clientela e estão criando formas próprias de trabalho - muitas com sucesso. Não é uma tarefa fácil nem existe uma fórmula conceitualmente correta para lidar com a situação. Cada caso é um caso (saiba como pedir ajuda no quadro abaixo). A professora de Geografia Marilda Dutra, da EE Nossa Senhora da Conceição, em São José, na Grande Florianópolis, por exemplo, aprendeu uma lição curiosa logo nos primeiros dias de trabalho. Para ensinar quem não ouve, ela tem de falar mais. A maior mudança foi deixar o giz em segundo plano. Cada tipo de relevo, clima e vegetação precisava de fotografias, desenhos, gravuras e muitos exemplos verbais. Em vez de simples mapas, o mundo passou a ser representado em bolas de isopor para facilitar a compreensão dos meridianos.

Maria Inês Vieira, coordenadora do Programa de Acessibilidade da Divisão de Educação e Reabilitação dos Distúrbios da Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Derdic-PUC), explica o motivo da necessidade de rever o uso do quadro-negro. "Mesmo que o surdo já saiba ler e escrever em português, ele demorará mais para entender orientações por escrito", diz. A especialista ensina que o ouvinte entende a sequência de palavras escritas porque tem uma cultura prévia oral. Já quem não ouve está sendo apresentado ao português como um todo e não conhece a organização da língua. "Os conjuntos de palavras podem não fazer sentido na maneira como ele aprendeu a pensar. É como traduzir apenas as palavras de um texto em alemão ou chinês. Não é o suficiente para a compreensão do todo", diz. Em Florianópolis, a professora de Matemática Silvana Maria Soster teve outra reação no início do ano passado, quando foi informada pela direção da EM Luiz Cândido da Luz que uma de suas classes da 2ª fase do ciclo 2 (equivalente ao 5º ano, mas já com um docente por disciplina) teria quatro alunos surdos. "Tomei um susto. Nunca tinha passado por isso e pensei: será que posso?", conta. Para Roseli Baumel, educadora livre-docente especializada em Educação Especial da Universidade de São Paulo (USP), esse tipo de dúvida é natural. "Temos de ser honestos e admitir que não estamos prontos", orienta a especialista.

Recebi um aluno surdo. E agora?
Peça ajuda. Esse é o conselho da professora livre-docente Roseli Baumel, da Faculdade de Educação da USP. Ela divide esse S.O.S. em quatro partes:
*Família A participação da família ajuda em qualquer caso, mas, se o aluno é surdo, a conversa precisa ser mais constante e aprofundada. Descubra como é a comunicação em casa, desde a linguagem utilizada até o que mais chama a atenção da criança.
*Entidades Procure apoio em uma instituição que atenda os deficientes, como o Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), no Rio de Janeiro. Muitos oferecem aulas de libras e dicionários da língua e auxiliam na escolha de materiais para facilitar o aprendizado. Enquanto a escola não tem sala de apoio, algumas ONGs podem dar aulas de libras e reforço às crianças no contraturno.
*Professores Converse com outros docentes do aluno, de disciplinas diferentes ou anos anteriores. Procure repetir experiências de sucesso e pergunte também o que não funcionou para evitar os mesmos erros. Busque exemplos em outras unidades de ensino. "É preciso debater o ensino, fazer encontros e trocar informações", diz Roseli.
*Governo Os alunos têm direito a um intérprete, e a escola, a materiais apropriados e a uma sala multidisciplinar. O governo também deve oferecer cursos de libras para os professores. As aulas devem ser dadas em faculdades que fazem convênio com o Ministério da Educação. Além disso, unidades com mais de 100 alunos podem pedir recursos para a montagem de uma sala de apoio pelo Programa Escola Acessível. Informações podem ser obtidas pelo telefone 0800-61-6161.

Recursos diferenciados para a turma heterogênea
OBJETOS VARIADOS AJUDAM A ENSINAR A professora Silvana Maria, de Florianópolis, levou um susto quando soube que receberia quatro alunos surdos. Hoje, ela não só ensina para os estudantes com deficiência como também aplica parte da metodologia diferenciada, enriquecida por materiais diversos, nas salas só com ouvintes. "As dificuldades dos outros meninos são iguais. Apenas achei mais uma forma de resolvê-las".
Passado o receio inicial, Silvana percebeu com o tempo que quase tudo precisava ser adaptado: a postura, a maneira de falar, a avaliação e, principalmente, os materiais. "Uma pessoa que cresceu sem escutar aprende por observação. Ela precisa ver, montar e perceber os conceitos de forma concreta", diz Roseli. Foi assim, com aulas visuais e exemplos palpáveis, que conseguiu lecionar. Usou material emborrachado, quadrados, cubos, jogos, dados e desenhos. Ensinou adição com objetos que se agrupavam. Para a multiplicação, dividiu os próprios alunos da sala em quadrados desenhados no chão: três turmas de quatro igual a 12, cinco grupos de cinco crianças resultavam em 25. As frações foram entendidas com círculos desenhados na mesa em formato de pizza: com dois pedaços do total de oito, se faz um quarto. Até a probabilidade ficou mais fácil com uma boneca de papel e várias roupas para combinar. No entanto, mesmo com materiais diferenciados e maior número de explicações orais, um cuidado essencial deve ser tomado para garantir um trabalho de sucesso. O educador precisa se policiar para não fazer duas versões da aula - uma para os alunos que escutam e outra para os deficientes auditivos. Como explica Ronice Muller, coordenadora do primeiro curso de licenciatura Letras-Libras do país, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a base da inclusão é a integração total entre os alunos. "A escola deve se tornar bilíngue. Os colegas têm de aprender Libras, afinal, no futuro, eles vão falar com os surdos inclusos na sociedade", afirma. Para isso, professores da língua de sinais devem dar aulas aos ouvintes e incentivar trabalhos em grupo. Foi o que aconteceu em Irará, cidade de 25 mil habitantes a 128 quilômetros de Salvador. A EM São Judas Tadeu começou a receber surdos em 2005. Além dos professores, as turmas em que os deficientes auditivos são matriculados recebem noções de libras. "As crianças aprendem rápido e, em vez de ficar com preconceito, logo ajudam os professores a entender o que os colegas surdos dizem", explica o diretor da unidade, Márcio Jambeiro.

A falta que os intérpretes fazem
No ano passado, dos 64.150 alunos surdos recenseados pelo Ministério da Educação no Brasil, 54% estavam em classes regulares. Mas o primeiro levantamento que cruzará o número de intérpretes com as matrículas dos deficientes auditivos só deve ser feito este ano. Mesmo antes da divulgação dos resultados, especialistas e autoridades imaginam o que ele dirá: não há profissionais suficientes. É por causa da carência que entidades do setor ainda defendem as escolas especiais segregadas até o fim do Ensino Fundamental. Em muitas unidades de ensino regulares, alunos surdos ainda estudam sem intérpretes, o que revolta integrantes da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis). "A inclusão não está funcionando", diz o diretor da entidade em São Paulo, Neivaldo Augusto Zovico. "Os professores estão despreparados e as secretarias de Educação não contratam intérpretes. Os alunos acabam frustrados por não entender nada e desistem", reclama. A coordenadora do Programa de Acessibilidade da Derdic-PUC, Maria Inês Vieira, defende o mesmo ponto de vista. "Acredito em inclusão na sociedade, mas não na Educação Básica", diz. Ela explica que, para o aluno surdo, o português é uma segunda língua e deveria ser ensinado após a primeira, libras. A diretora de Educação Especial da Secretaria de Educação Especial do MEC, Martinha Dutra, afirma que a inclusão total é uma questão de tempo. "Faltam profissionais porque tudo é muito novo. A própria regulamentação do intérprete no Ministério do Trabalho ainda está em curso, mas isso vai ser acelerado com a multiplicação do conhecimento de libras", argumenta. Pela nova perspectiva de trabalho das autoridades, as instituições especializadas deixam de receber verbas por crianças atendidas de maneira segregada, em escolas especiais. No novo modelo, essas entidades devem usar a experiência acumulada para ajudar a inclusão na rede pública, em contratos com estados e municípios, por exemplo. Outro fator que incentiva essa modernização é um decreto federal, assinado em 2008, que dobra o valor do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb) para alunos com deficiência inclusos na rede regular, se atendidos pelo contraturno público e estudando regularmente com intérprete, como manda a lei.

Conversas animadas, mas sem sons nem gritos
LIBRAS TAMBÉM PARA QUEM ESCUTA Na EM São Judas Tadeu, em Irará, a 128 quilômetros de Salvador, as aulas oferecidas pelos tradutores eram anunciadas nos corredores para que estudantes e docentes pudessem se organizar e participar. A adesão foi grande. "Vinham professores e alunos. Às vezes, também um porteiro ou o diretor", conta a intérprete Edma Oliveira dos Santos. Hoje, é comum ver alunos surdos e ouvintes conversando normalmente no pátio.
Os cursos de libras para ouvintes começaram explorando os horários livres dos intérpretes. As aulas dos tradutores eram anunciadas nos corredores e na sala dos professores para os interessados. Havia opções em vários dias e em horários diferentes. Assim, os estudantes ouvintes que aprendiam o básico começavam a prestar atenção nos movimentos do intérprete em sala, ouvindo ao fundo a voz do professor e decorando as palavras. No fim das aulas, era comum ver estudantes tirando dúvidas sobre as lições. "Hoje, as crianças que estudam em salas com surdos se comunicam bem com eles. Mesmo no intervalo, você anda pelos corredores e vê todos conversando em libras fluentemente." A fase adiantada em que se encontra a inclusão na cidade baiana mostra que boas iniciativas podem prosperar mesmo fora das grandes capitais. Muito desse sucesso se deve a 20 anos de dedicação de uma professora. Nos anos 1980, Edma Olivera dos Santos dava aula para o Ensino Fundamental em uma escola rural multisseriada, quando recebeu um aluno surdo. "Na época, a orientação era falar devagar e esperar que eles aprendessem a leitura labial. Percebi que não ia funcionar e comecei a sinalizar, eles sinalizaram de volta e assim foi", lembra. Com o passar dos anos, ela aprendeu libras e começou a ser procurada por todos os pais de surdos de Irará. Quando o governo instituiu que os deficientes auditivos deveriam estudar em escolas regulares, ela se tornou intérprete de seus ex-alunos na EM São Judas Tadeu. "Tenho orgulho de dizer que eles estão entre os melhores em todas as turmas", afirma. Mesmo com experiências pioneiras em desenvolvimento no Brasil, especialistas, autoridades e docentes reconhecem que ainda há dificuldades e falhas. Faltam experiência e, na maior parte do país, material adequado, salas de apoio e intérpretes. A maioria dos surdos só aprende Libras quando vai para escola e, até que se tornem fluentes no idioma, não entendem os intérpretes e podem perder o interesse. A recomendação de Edma a qualquer colega que receber um aluno surdo é que enfrente o desafio. "Para eles, a escola é ainda mais importante. Quando um deficiente auditivo aprende a escrever, vai ao médico sozinho e bota no papel: eu estou com dor de cabeça. O professor tem em mãos a grande chance de dar autonomia a uma pessoa."

Revista Nova Escola- Inclusão/abril/2009
Fonte:http://revistaescola.abril.com.br/inclusao/educacao-especial/falar-maos-432193.shtml
Contribuição e postagem: Marília